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19/03/21Esports

"A última chance": Jonn, Gamelanders

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“Eu falei para o Jhow: ‘é a minha última vez. É a última vez que eu boto a mão no teclado, é a última vez que eu faço isso pra valer. Se não der certo, eu quebro meu computador, vendo tudo. Eu vou dar 300% de mim. Vou dar tudo que eu sei, tudo que eu aprendi nesses anos pra fazer valer a pena’. E ele falou ‘cara, última chance. The last dance’.

Jonn acordou cedo. Na gaming house em São Paulo na qual a Gamelanders se preparava para as eliminatórias do VALORANT Masters Brasil, a rotina de treinos era intensa, mas o clima era calmo — ao menos para ele. Claro que existe pressão, claro que existe nervosismo. Mas de que importa? Ele finalmente vive o sonho. Isso é detalhe.

Foram 9 anos até ali. 9 anos até o momento em que ele se senta em frente ao computador fornecido pela organização e me conta sua história, a voz ainda rouca. 9 anos até o primeiro contrato. Um título mundial veio antes de seu primeiro salário como jogador profissional. Pra que se estressar? O auge é agora. A chance é essa.

O duelista da Gamelanders é conhecido como a melhor mira do Brasil, mas não se deixa afetar pelo título. Não importa. “Sou um cara muito humilde, nunca vou me afetar por esse tipo de pensamento. Tu nunca vai ouvir isso da minha boca. Eu fico feliz que as pessoas acham, eu treino pra isso, sinal de que meu esforço tá fazendo valer. Mas eu só gosto de jogar, Eve.”

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“E qual é a história dessa mira?”, pergunto, com um sorriso. Jonn retribui e arrisca. “A historiazona toda, desde o começo?”


Carioca de Itaboraí, Walney Reis conheceu o FPS nas lan houses. Sentiu o gosto da competição ainda adolescente, ao “tomar um espanco” em uma qualificatória no Counter-Strike 1.6, história que conta com bom humor. Ficou nervoso, pipocou e foi chamado de cheater. “E o pior é que o que eu fazia antigamente é o que eu faço até hoje: me internar na DM [Mata-Mata]. Desde uns 13, 14 anos, eu jogava muita DM porque eu sempre gostei de praticar assim, de maneira aleatória.”

O lançamento de Point Blank trouxe perspectiva — o game teria um campeonato Mundial, e o objetivo era chegar lá. “Em 2011 teve o primeiro Mundial, mas eu não participei da classificatória, tinha acabado de começar a jogar. Uma galera viajou, e eu vi que eles viajaram. Aí eu falei ‘como assim uma empresa tá pagando pra os caras viajarem?’ Eu não acreditei. Aí quando eu vi os caras lá fora, falei ‘mano, que daora. Quero viajar também’”, relembra Jonn.

Com o tempo, o jogador conheceu a elite do FPS e montou seu time. A meta era a viagem internacional, e, no final da seletiva, jogou contra o time de Jhow, melhor equipe do servidor, e venceu. Achou que fosse piada quando percebeu que iria para a Indonésia — mas foi, com tudo pago pela desenvolvedora.

“Cheguei pro meu pai com 18 anos e falei ‘tô indo viajar’. E ele falou: ‘como assim tu tá indo viajar? Tu não tem dinheiro, pô’”, o sotaque carioca aparecia enquanto Jonn narrava, bem-humorado. “Aí eu falei ‘pô, tô indo viajar aqui de graça. Consegui uma passagem de graça, ganhei o campeonato e tô indo viajar’”, conta, aos risos.

Não é como se ele tivesse chegado perto de vencer o Mundial de 2012 — mas a virada de chave aconteceu da mesma forma. “Quando eu pisei no Mundial, eu tive a sensação de que eu queria isso pra minha vida”, crava.

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Jonn em 2013 (Reprodução/OnGame)

Aos 18 anos, Walney precisava escolher uma carreira, e seu pai o pressionava para que seu caminho fossem os estudos. Mas ele queria viver do jogo. Tinha provado a sensação no torneio internacional, e queria mais.

“Só que olha como o pensamento era imaturo: eu queria viver de um negócio que nem se pagava”, relembra. “Com 18 anos, você tem que começar sua renda, começar sua vida. (...) Eu sempre quis ser independente. Então como eu falo pro meu pai que eu queria jogar um jogo que não se paga?”

Na época, não existia contrato, salário, gaming house. Não havia garantia de estabilidade para jogadores profissionais. As brigas persistiam, mas Jonn passou a se virar quando o dinheiro de premiações começou a chegar. Conseguia pagar suas próprias coisas e não pedia mais ajuda aos pais — mas a condição era ficar em primeiro lugar. “Se a gente não ganhasse o campeonato, esquece, não tinha dinheiro no mês”, recorda, dando de ombros.


Em 2013, o rival Jhow se tornou companheiro de equipe — parceria que vem até hoje. Montaram o melhor time da época, de acordo com ele, e fizeram o primeiro bootcamp do jogo. “30 dias enfurnados na casa do cara comendo miojo”, Jonn ri. “Mas pra a galera, ‘noooossa, os caras tão fazendo bootcamp. Tão se preparando para o Mundial. Ganharam tudo o ano todo e ainda metem um bootcamp? Pode entregar o prêmio pra esses caras’.”

No entanto, um problema que o perseguiria ao longo de toda a carreira fez sua primeira aparição: a falta de um time em que todos estivessem na mesma página.

“Não adianta você ter a mentalidade de querer muito se o cara do seu lado tá cagando, sabe”, desabafa Jonn. “Foi aí que eu notei que, pra ganhar, eu teria que ter um time muito sólido. Tem que querer a mesma coisa que eu, ter o mesmo pensamento que eu. Isso foi uma coisa que me assombrou por anos. Eu queria muito, o Jhow também. Só que os outros caras, esquece.”

Na seletiva para o Mundial de 2013, o time perdeu. Mesmo na derrota, a sinergia com Jhow era intensificada: sabia que estavam na mesma página.

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Um novo jogo de FPS surgiu, e, quando grandes campeonatos foram anunciados, migrar para ele ao lado de Jhow era o caminho natural. Descobriram que FalleN — que já era uma lenda na época — jogaria a seletiva para o World Cyber Games (WCG) daquele ano no Assault Fire, e a motivação cresceu.

A dupla foi para a final e enfrentou o time de Gabriel Toledo. “Ganhamos do FalleN. E depois ele lembrou, fiquei sabendo que ele lembrou. Satisfação enorme, ser lembrado pelo Verdadeiro.” Conquistaram uma vitória expressiva contra um ídolo, e a viagem internacional do ano havia sido garantida — mas, para quem queria viver do jogo, mais um tombo viria.

Depois que FalleN perdeu o campeonato para Jonn e Jhow, o cenário competitivo saiu de evidência e as oportunidades foram minadas. A dupla foi para a China disputar o campeonato mundial, mas problemas com os outros companheiros afastaram mais uma vez a taça de suas mãos.

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Modera, Jhow, 400kg, Jonn e Roy (Divulgação/WCG)

“Eu falava pro Jhow: ‘cara, enquanto a gente não tiver a base, a gente não vai ganhar. Não vai ganhar o Mundial. A gente tem que ter a base, tem que ter uns caras que pensem igual eu e você’. Aí o Jhow falou ‘cara, vamos dar um tempo’. Na época, não tava tendo muito campeonato no PB. ‘Vamos dar um tempo de PB, e quando a gente tiver oportunidade de jogar com uns caras bons, a gente volta’”, narra.

Sempre era sobre Jonn e Jhow, durante todos esses 9 anos. “Desde a primeira vez que eu conversei com o Jhow, a gente sempre foi transparente um com o outro, e se hoje eu quero estar no topo do mundo, ele tem que estar do meu lado. É um cara que eu fecho o olho e falo ‘mano, se eu olhar para a esquerda, eu sei que na minha direita tem alguém guardando’. É o que eu penso dele dentro de jogo.”

“Ele é um dos jogadores mais completos que tem no VALORANT. As pessoas ligam muito pra frag, mas eles não sabem o que o Jhow passa dentro do jogo, não sabem a confiança que o Jhow passa, eles não sabem o quanto o Jhow garante de Clutch. E fora do jogo eu nem preciso falar. Conheço o cara há 9 anos, se eu não gostasse eu não estaria jogando com ele. Eu considero ele meu irmão, de sangue mesmo.

As tentativas de viver do jogo continuaram. Migraram para o CS:GO, mas, apesar de Jonn se destacar, o time ainda não era o certo. “Sabe quando você monta algo e pensa: ‘beleza, a gente vai chegar a algo, mas a gente não vai ganhar?’ Era isso. Porque sempre tem um cara que não tem a mentalidade de dar a vida”, conta.

Enquanto isso, os conflitos em casa prosseguiam e se intensificavam. Enquanto sua mãe o incentivava, seu pai cobrava, e Jonn sabia que as críticas tinham fundamento. “‘Po, e aí, como tá? Você não tem contrato, não tem time. Viajou, ganhou uma merreca e não tem como se manter… Tem que procurar fazer alguma coisa da vida. Como vai ser seu futuro?” eu ficava ouvindo essas paradas. Meu pai tava pensando na minha vida futura, e não tava errado jamais”, assume o jogador.

Por pressão do pai, começou a fazer faculdade. Foram seis meses de Sistemas de Automação; depois, trocou de curso e foi para Ciência da Computação. Enquanto isso, prosseguia no FPS. Seu time perdeu um campeonato importante e se desmantelou. “Lá volta eu e o Jhow pro PB de novo”, suspira.

O único desejo era o de viver do jogo. A única coisa que a dupla almejava era uma chance. “A gente só queria uma oportunidade, Evelynn”, solta Jonn. “Eu e ele sempre buscamos uma oportunidade.”

Em 2014, o jogador foi chamado para um time de estrelas e ficou 5 meses sem jogar com Jhow, que havia sido tirado do time por, na época, não estar treinando como os outros jogadores. Bateu na trave mais uma vez, não passando na seletiva para o Mundial daquele ano.

“Eu lembro até hoje, chorei muito na lan. Porque foi uma parada que eu me doei 100%, abdiquei de tudo, fui contra o que o meu pai falava, e quando eu perdi ali, doeu muito. Fiquei mal, fiquei mal mesmo. Falei ‘mano, acho que essa vida não é pra mim. Tô tentando, tentando, algumas coisas deram certo mas parece que tá sempre batendo na trave. A sensação que eu tinha é que não era pra mim.”

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“E eu falei pô, ja to sem o Jhow, que era minha base, que tava sempre comigo. Tiraram o Jhow do time. Perdi o negócio que tava ganho, praticamente. (...) Não era o time certo. Bateu a crise existencial, fiquei um pouco depressivo”, conta.

Voltou a jogar com Jhow, e a jornada continuou, mas sem o mesmo foco de sempre. “Estava mais voltado pra faculdade do que jogando. Tinha desistido, entregue. Tudo que meu pai tinha falado estava acontecendo: eu não tava vivendo do jogo, não tinha dinheiro, não tinha contrato.”

Em 2016, a dupla cansou das tentativas e pensou em desistir. Justamente nesse ano, encontraram os companheiros de equipe que procuraram durante anos. Foox, Koy e Fzn “o cara mais louco que eu já vi na vida” — fecharam o time, ensinando Jonn que uma equipe que se entende e tem o mesmo objetivo é muito mais efetiva do que um time de estrelas.

O grupo “varreu” a seletiva e conseguiu a vaga no Mundial. Jonn voltaria ao palco internacional depois de três anos e, com base nos resultados dos representantes dos anos anteriores, acreditava que o título era possível. “A gente perdeu o primeiro jogo e ganhou todo o resto. (...) Quando eu tinha jogado a toalha, eu ganhei”, sorri.

Ali, percebeu que o que havia mudado era sua mentalidade. “Pensei em me divertir, em aproveitar o momento. Foi isso que me fez conquistar o que eu conquistei. Aprendi a ter um time, o que é preciso pra que um time vença, conheci pessoas maravilhosas”, diz.

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Da esquerda para a direita: Fzn, Jhow, Foox, Jonn e Koyote (Foto: Acervo pessoal)

Depois do Mundial, o time se desfez. Jonn guardou o dinheiro da premiação e passou mais alguns meses tentando ao lado de Jhow, sem sucesso. Em abril de 2017, deixaria o FPS e sua carreira.


“Eu descobri que meu pai tinha câncer”, confidencia, com a voz baixa. “Pesou demais em mim. Eu dediquei 2 anos da minha vida, de 2017 a 2019, cuidando dele. Tirei carteira [de motorista], levava ele pra médico, fazer exame.”

Seu pai teve Linfoma do Manto, tipo de câncer raro que afeta os linfócitos, células de defesa do sangue. “Aí acabou pra mim, minha vida profissional. 2017 foi o ano em que eu menos joguei. Saía com ele às 6, 7 da manhã, dirigia dia e noite, chegava cansado.”

“O Foox me chamou pra jogar PB. Falei do meu pai pra ele, ele falou ‘cara, entra aqui, vou te distrair. Vamos jogar juntos, dar a vida, ganhar essa parada aí’. A gente jogou o campeonato, mas eu não tinha cabeça. Perdemos na final — eu perdi pro Nyang, inclusive. Aí eu realmente larguei o jogo.”

As palavras de seu pai ao longo dos últimos 5 anos tinham mais peso nesse momento. A falta de conquistas o desanimava: “Só conquistei o Mundial. Conquistei coisas pessoais, ganhei de caras famosos, mas em termos financeiros, eu tava na merda. O dinheiro do Mundial não ia durar pra sempre, eu sabia disso.”

Com sua dedicação, seu pai se recuperou do câncer. Jonn, no entanto, estava cada vez pior. Depressivo, ansioso, “lá embaixo”. Sua namorada, Letícia, o incentivou a voltar ao jogo. “Ela falou pra eu procurar o Jhow. ‘Fala com ele, monta um time. Vai sair esse jogo, o Zula. Vai jogar com ele. Seu pai já tá melhor, se recuperou. Vai lá brincar.’

Ele foi. No cenário de Zula, conheceu Mwzera: “O Mw rasgava o joguinho, cortava boneco como se fosse nada”, brinca. “Um dos caras mais difíceis que eu já troquei tiro. (...) Fomos jogar contra ele… o cara tinha 8 meses de jogo, a gente tinha 2. Ganhamos dele na LAN. Mais uma viagenzinha, só glória”, relembra.

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Patoxy, Koyote, Jhow, Pablex, Jonn e Reezq (Foto: Acervo pessoal)

Jogaria outro Mundial — mas teria que enfrentar seu pai. A conversa, no entanto, mudou sua vida.

“Ele viu, falou que eu cuidei dele e se sentiu mal por ter me pressionado durante tanto tempo. A gente chorou juntos. Foi uma parada muito forte. Ele me disse pra seguir meu sonho, fazer o que eu gostava. Foram anos esperando isso do meu pai e ele foi me falar no momento mais difícil da vida dele e da minha”, diz.

“Eu não tava preparado. Lembro até hoje dele falando: ‘Segue seu sonho, faz o que você gosta de fazer. Quando você chegar lá, se dedica, dê seu máximo, e faça valer. Faça valer o tempo que você estiver ali. Aproveita. Porque não é duradouro.’ No final, ele disse: ‘Eu só pensava que queria um futuro melhor pro meu filho’. Chorando pra c, lembro até hoje.”

O Mundial foi bom, mas também não deu a Jonn e Jhow a oportunidade de viver do jogo. “Tudo que eu passei nesse tempo de game, eu nunca tive um investimento. Ninguém que confiasse no meu trabalho, ninguém que chegasse em mim e dissesse: Jonn, seu time é brabo, vou investir em você.”

Depois do campeonato, sua equipe se desfez. De novo. Em 2019, o Zula acabou, e Jonn entrara em um limbo. “Ficou eu e o Jhow jogando RPG, esperando um jogo, esperando a hora certa. Não sabia o que fazer da vida, se eu reabria a faculdade que tinha trancado, se continuava no PC esperando.”

“Foi aí que, em 2019, vi uma notícia falando que sairia um jogo chamado Projeto A.”


O anúncio era do FPS da Riot Games, que se tornaria VALORANT. Mas o jogo só sairia na metade de 2020, e Jonn precisava de um plano B, um direcionamento, qualquer coisa. “Quanto mais eu ia pesquisando outras coisas pra fazer, mais no limbo eu caía. Fiquei depressivo o ano inteiro, não jogava mais”, relembra.

Jhow e Mwzera migraram para o Rainbow Six: Siege e chegaram a jogar a Challenger League, mas Jonn não havia gostado do jogo. “Depois do Zula, trouxemos o Mw pro time e eu falei pro Jhow: ‘eu tô saindo, mas não tira esse cara do seu lado. O moleque tem um talento natural pra jogar e é muito esforçado, e talento com esforço, você sabe no que dá.’

“Você vê o potencial da pessoa e acha que chegou no limite, mas tu não sabe. Ele [mwzera] é um cara que simplesmente tudo que ele faz dá certo. Então a gente falou: ‘esse cara a gente tem que ter do nosso lado sempre. Quando a gente for jogar, a gente tem que chamar ele. Vai ser ele, a gente vai chamar ele.’

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Mas ainda não era o momento, e a depressão tomava conta de Jonn. “Não sabia o que fazer da vida e não tinha um p... no bolso. Tudo que eu tinha ganhado e investido eu tinha perdido.”

“Bati no meu pai e falei ‘cara, você tinha razão. Acabou. Tô no final da minha carreira e eu não tenho nada. Foi como você disse.’ Ele me disse: ‘Pelo menos você foi feliz. Tava feliz fazendo. Não ganhava nada, mas era feliz.’ E eu falei: ‘É… muito feliz. Eu era uma pessoa muito mais feliz.’ ‘Filho, pelo menos você tentou. Agora, eu vou te ajudar a se reerguer como você me ajudou quando eu precisei de você. Vamo lá.’

Seu pai emprestou dinheiro e ele tentou outros investimentos, mas nada dava certo. Essa foi a pior baixa de sua vida. “Eu pensava: ‘só queria que alguém investisse em mim e no meu time. Só queria jogar um jogo que realmente valesse a pena jogar.’ E achava que nunca mais ia ter isso na vida”, relembra.

Foram meses longe dos colegas do jogo, de Jhow, de Mwzera. No início de 2020, a então noiva o incentivou mais uma vez a voltar: “Ela sabia que eu me distraía quando tava com a rapaziada. Aí eu voltei a falar com eles. E lançou o VALORANT.”

“Eu falei para o Jhow: ‘é a minha última vez. É a última vez que eu boto a mão no teclado, é a última vez que eu faço isso pra valer. Se não der certo, eu quebro meu computador, vendo tudo. Eu vou dar 300% de mim. Vou dar tudo que eu sei, tudo que eu aprendi nesses anos pra fazer valer a pena’. E ele falou ‘cara, última chance. The last dance’.”

Jonn e Jhow tinham o plano traçado. “A primeira coisa que a gente vai fazer é chamar o Mw. A segunda coisa é chamar dois caras que realmente pensam como a gente. Que realmente passou pelo que a gente passou. Se a gente não achar esses caras, esquece”, cravou ao colega. No servidor norte-americano do beta fechado, o trio buscava dois jogadores para fecharem seu time.

“A gente via o Nyang e o Fzn jogando ranked pra caramba, sempre do outro lado, a gente se batia muito na ranked. Porrada comendo, a gente falou cara, esses dois passaram pelo que a gente passou. Eu não era muito fã do Nyang, ele tinha um gênio forte, não aceitava críticas, era difícil de conviver”, assume. Mas os altos e baixos compensariam.

“Aí começamos a nos dedicar, e… essa história você já sabe do resto, né?”

Sim. Em junho, conquistaram o título da Copa Rakin. Em julho, a Gamers Club Ultimate. Em setembro, a Aorus League e a EVOlution Open; em Outubro, a segunda Copa Rakin. Em dezembro, a Copa BrMalls e o First Strike Brasil. 7 títulos em um ano. Representando uma organização. Vivendo do jogo.

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Após a GC Ultimate, a Final Level ofereceu ao time um contrato. “O Mw chegou e sentou na janela”, ele ri, “mas eu, Jhow, Nyang e Fzn, a gente passou por poucas e boas. Eles viveram a mesma coisa que eu, de ouvir promessa, promessa, promessa. Pra a gente era ‘tá, vamo assinar, mas eu duvido que o dinheiro vai cair na conta.’

O primeiro salário foi uma conquista maior do que muitos de seus títulos. “A gente vibrou tanto no TeamSpeak. Pareciam umas criancinhas, 4 crianças comemorando: ‘caraca, somos assalariados, moleque, estamos vivendo do jogo’. Foi muito impactante. Por isso, pra mim, a gente é diferente dos outros times. A gente dá muito valor pra tudo que a gente faz. Cada campeonato, cada jogo.”

Jonn tem cada um desses momentos, cada perrengue que passou tentando viver do que ama como motivação para dar tudo de si no VALORANT. Claro que o dinheiro é importante, mas a certeza de que não ficará desamparado é valiosa demais. E se converte em esforço.

“As pessoas falam: ‘nossa, vocês são muito focados, não descansam’. Cara, se a gente descansa tem alguém passando a gente. Nosso jogo é o mais manjado do cenário, todo mundo sabe o que a gente faz. E a gente continua chegando na final. Isso é o nosso trabalho sendo recompensado”, diz.

Para Jonn, a garra da Gamelanders vem dos valores que aprenderam com todos os jogos que construíram suas trajetórias. “É uma dedicação que veio de 2011. Não é de hoje”, garante. Jonn disse a seus companheiros: “Rapaziada, agora a gente tem tudo que a gente precisa. Tem pessoas apoiando a gente. Vamos fazer valer.”


E, aos poucos, Jonn foi acreditando. Com o salário mensal, com os títulos, com a estabilidade no topo. Em dezembro, para a disputa do First Strike, decidiram buscar um bootcamp — a organização se antecipou e convocou o time para o escritório no Rio de Janeiro.

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Com seu carro, o então duelista da Gamelanders levava os parceiros de time do apartamento bancado pela organização até o escritório. “A ficha caiu. De onde a gente tava, do que estava acontecendo. E de como era legal estar vivendo aquilo.”

Mostrei pro meu pai e ele chorou mais uma vez, orgulhoso de mim por ter ido atrás do meu sonho. Minha mãe também, que sempre falava que eu ia conseguir. Dizia pra eu persistir. (...) Essa foi minha loucura de vida. Minhas glórias foram acontecer no finalzinho”, sorri.

“Acho que muito do nosso sucesso é por conta disso: porque a gente faz por amor, pela paixão. A gente não liga pra status, nunca ligou pra ego, sempre fomos humildes. Eu acho que é essa a essência. Quando você quer chegar onde os maiores chegaram, não é passando por cima de ninguém, não é sendo melhor do que ninguém, é fazendo o seu.”

Jonn chegou onde queria. Finalmente vive do sonho, e a meta agora é continuar. Mas Jonn ainda é campeão mundial, e isso não muda. No VALORANT, quer ir ainda mais longe.

“Meu objetivo é com certeza ganhar o Mundial [Champions], mas não só um. Quero ganhar vários, ser o maior ganhador de mundiais da história do VALORANT. Pra ninguém me passar e nem passar o meu time. Ganhar muitos mundiais e muitos campeonatos”, mira.

Apesar disso, não há pressa. O momento agora é de aproveitar e continuar feliz com o que faz. “Depois de todo esse tempo e de toda essa luta, meu maior divertimento, minha maior felicidade diária é jogar VALORANT e saber que eu tenho um time bom, que eu tenho pessoas maravilhosas ao meu lado. Quero continuar com isso durante longos anos. Se eu puder ter isso, eu tô feliz. Títulos, dinheiro, tudo é consequência do que eu faço.”

O que move Jonn é a gratidão por ter conquistado o sonho de sua vida e a vontade intensa de continuar vivendo do que ama. Aproveitando cada round, mapa, série e campeonato. Grato pelo VALORANT, pela Gamelanders e pela garra de nunca ter desistido, mesmo querendo. Mesmo tendo motivos. “Agradeço todo dia quando acordo por estar vivendo isso”, diz.

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Quer continuar dando tudo de si. Ama jogar, ama treinar, ama a rotina, ama os campeonatos. Pergunto o que ele pensa quando está treinando, e ele sorri, calmo.

“Evelynn, eu só jogo naturalmente. A primeira pergunta que eu faço pra mim é se eu tô feliz fazendo isso, se eu gosto de fazer isso, amo fazer isso. Se eu jogar 12, 14, 16 horas, eu vou estar feliz fazendo isso. Já passei por coisa pior sem ganhar nada! Agora que eu tô bem, pô, tô muito bem... jogo por horas rindo, feliz, e isso pra mim é o que importa”, finaliza.

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